O SABER E O SER
O conhecimento é algo que cai no Centro Intelectual e
cria a ilusão que o homem tem o saber. De uma maneira comum uma pessoa adquire
um conhecimento através de livros, cursos e observação exterior de
acontecimentos. Tudo isso alimentará a Personalidade que necessitamos para ter
uma vida normal com a sociedade. Vamos dizer que uma pessoa adquire um saber de marcenaria ou de pintura a óleo.
Ele compra livros e começa a treinar, logo vai verificar que apesar de ter
lido, visto e observado, não vai conseguir executar quase nada, vai serrar
torto, pintar lambuzando toda a tela e pode até perceber que não consegue nem
pregar um prego. Apesar de ter lido vários livros e perguntado para várias
pessoas como fazer. Se ele insistir e continuar apesar de errar, com o tempo os
erros vão diminuindo, significando que seu conhecimento que era teórico, está
passando a ser prático, em outras palavras de simples conhecimento está
passando a ser saber. O homem é o que sabe, não o que conhece. Uma outra forma
é a seguinte: Apresento um amigo a várias pessoas numa festa e depois de um tempo todos passam a conhecer o Toninho. Mas eles não sabem quem
é o Toninho, apenas o conhecem. Eu sei que ele é pintor, poeta, não é ladrão e
gosta de doces e chá.
O saber é um nível acima do conhecimento e também o
próprio saber tem níveis diferentes que podem mudar o ser das pessoas.
Uma pessoa pode ter um saber igual à outra e seu nível
de ser pode ser muito acima. Dois carpinteiros podem ter o mesmo saber sobre a
sua profissão. Um deles, o A possui um equilíbrio interior, não se exalta, é
paciente e o dinheiro que ganha o gasta moderadamente para não lhe fazer falta.
O outro, B, é um exaltado, impaciente, e sempre se mete em dificuldade
financeira e etc. O A tem amizade com seus vizinhos e o B, nenhum de seus vizinhos gostam dele, é
um sujeito mal visto.
Aqui no trabalho de Gurdjieff o mesmo acontece. Duas
pessoas recebem o mesmo exercício de psicologia para se fazer uma observação de
si. Um deles quando está perto de outros amigos, por algum motivo se exalta e
quer brigar, esquecendo os exercícios de auto-observação naquele momento e
coloca seu conhecimento limitado, cheio de rancores, orgulho, vaidade, ciúme
acima daquilo que se propõe para elevar
seu nível de ser que é uma observação
imparcial de si mesmo. Um outro, quando as coisas não acontecem como ele quer,
se observa, fica calmo e colhe na prática uma observação de si que pelo menos
naquele momento o coloca acima de seu próprio limite.
Em dado momento nos vem uma influência de alguém,
imediatamente as vozes interiores baseadas em nossos conceitos mecânicos, nos
domina passamos a responder ou não aquilo
que nos foi dito ou o que vemos. Neste momento podemos escolher ou
sermos o que sempre fomos, desta maneira nada mudará, nem nossas idéias,
sentimentos e acima de tudo nossa compreensão se estiver em zero, neste número
continuará, mas caso contrário, se decidirmos não reagir mecanicamente,
relaxamos nosso corpo, observamos nossos sentimentos e até nosso conceitos e
pré-conceitos e não reagimos, apenas
observamos, nada mais ao dar respostas a uma conversa procuramos o Centro
Intelectual e a razão baseada na observação do fato e não nos conceitos que
sempre tivemos, como ponto de vista, penso assim, sou assim, gosto disso, não
daquilo e etc.
Toda a pessoa que decide mudar, tem que sacrificar
suas fraquezas, aquilo que o faz dormir, ser o mesmo que sempre foi. Agora se a
pessoa entra nos Trabalhos de Gurdjieff e se considera perfeito, correto e
satisfeito com o que é, deve parar de se enganar que quer mudar seu próprio
nível. Aqui em nosso trabalho, queremos ser outra pessoa, não estamos
satisfeitos com o que somos, nem com a vida que levamos. Queremos outra forma
de encarar a vida, outra consciência, por isso tudo o que achamos correto ou
errado devemos observar imparcialmente. Apenas observar, não julgar. Nem o que
somos e nem o que nossos companheiros dessa jornada são.
Num grupo, uns gostam de cigarro, outros de bebidas
alcoólicas e um terceiro de falar muito, um quarto de ficar calado, etc...
Todos devem sempre lembrar que aqui
estamos para mudar nosso conceito de vida, e não como um clube social onde
devemos seguir regras de comportamento, etiqueta e moralidade. Aqui no nosso
grupo não nos importamos com o que as pessoas pensam ou agem em sua vida. Para
nós o que importa é o objetivo de acordar, ver, sentir, perceber, estar
presente nas atividades e exercícios nada mais. A meta a ser alcançada pode até
estar longe, mas o caminho a seguir sabemos qual é. E a nossa conduta externa pouco importa, pois
o nosso interior deve sempre estar atento. A mudança do ser não se baseia no
comportamento das outras pessoas, muito menos do que elas fazem ou pensam. O
importante é estarmos sempre presente sacrificando nossas fraquezas que acumulamos
durante nossas vidas. Todos aqueles que estiverem no grupo de Gurdjieff é um
companheiro de Trabalho e deve ser respeitado em suas fraquezas pois se fossem
fortes não precisaríamos de grupo nem de consciência. A luta é interior e
ininterrupta, sem trégua, caso contrário nada alcançamos.
(11/09/2000)
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